“Sereno” é um estado de espírito. Uma condição interior de paz, harmonia e autoconhecimento que se espraia do âmago do Ser reverberando em sua envolvência, moldando, por conseguinte, a paisagem da Vida. Neste sentido, “Sereno” (2021), o segundo disco do bandolinista, arranjador e regente Rafael Marques, é um retrato sonoro do caminhar do instrumentista pelas ruas de seu próprio destino.
Gravado “ao vivo” no Fábrica Estúdios nos dias 8 e 12 de março deste ano, o disco explora livremente as veredas do instrumental brasileiro, com fortes referências aos contornos melódicos do choro e da música nordestina, sem receio, porém, de incorporar influências da música andina, de um Oriente sonial e das trilhas sonoras do cinema; tudo firmemente alicerçado sobre a expressividade libertária da improvisação. É o que está posto, por exemplo, em “Flora”, uma valsa-choro de melodia sinuosa que articula uma estrutura métrica firme a um ambiente poco rubato flutuante; e na contemplativa “Um lugar”, uma vista do entardecer portenho pintada com notas, pausas, improvisos e respirações.
Acompanhando Rafael neste projeto estão os exímios músicos Alexandre Rodrigues (sopros), Julio Cesar Mendes (sanfona) e Marcio Silva (bateria); amigos e parceiros musicais de longa data, que formam aqui um grupo de instrumentação incomum, sem a presença do contrabaixo. O entrosamento e a comunicação telepática, porém, rendem ao quarteto forte sinergia e muita imaginação na interpretação dos temas, o que assegura ao trabalho além de grande qualidade artística um cariz pessoal marcante.
“A vida de todo o ser humano é um caminho em direção a si mesmo”, diz Hermann Hesse. No caso de Rafael, esse caminho é traduzido e documentado na música que compõe o álbum “Sereno”, que é também, por sinal, o nome de seu filho com a cantora Isadora Melo. E ao produzir o disco acompanhado de velhos amigos, o bandolinista faz do objeto artístico não só uma obra, mas também uma arquitetura de morar. Uma casa brasileira, simples, aerada e luminosa, sempre disposta a acolher o eterno peregrino dos sendeiros evanescentes da música: o ouvinte.
Portanto, boa escuta.
Texto: Angelo Mongiovi e Bruno Vitorino.
credits
released May 20, 2021
Gravado nos dias 8 e 12 de março de 2021 por Paulo Umbelino no
Fábrica Estúdios (Recife-PE-Brasil).
Mixado por Paulo Umbelino e Angelo Mongiovi no Fábrica Estúdios.
Masterizado por Pablo Lopes no Fábrica Estúdios.
Rafael Marques (bandolim)
Alexandre Rodrigues (sax barítono, clarinete e flauta)
Julio Cesar Mendes (sanfona)
Marcio Silva (bateria)
1. Moacirzando nº 1 - 5'00"
2. Flora - 3'30"
3. Um Lugar - 7'16"
4. Moacirzando nº 4 - 10'21"
5. Venezuelana - 3'27"
6. Na Varanda - 4'09"
7. Cúmbia das Arábias - 6'11"
8. Sereno - 3'20"
Todas as composições de Rafael Marques, exceto as faixas 1 e 4, de
Alexandre Rodrigues.
Fotos da sessão de gravação por Eduardo Costa Cunha
Fotos e design da capa por Eduardo Costa Cunha
Produzido por Rafael Marques, Angelo Mongiovi e Bruno Vitorino.
Uma ponte musical integrando os territórios jazzísticos de Recife e de longe, desvelando novos horizontes e tornando apreciáveis paisagens sonoras desconhecidas ou inexploradas.